segunda-feira, 7 de setembro de 2009

"O silêncio (...) tão detestado, porque aceite como inútil, onde o útil é soberanamente o que orienta.
O silêncio, que não dá prestigio e não suscita consideração porque o que conta é não estar calado, mesmo que através de interjeições vazias que são uma espécie de fronteira acústica entre o silêncio e o som das palavras pedidas no vazio das ideias.
(...) ficar em silêncio desqualifica, mesmo que nada se tenha para dizer. Num debate televisivo o que perde é o que fala menos, mesmo que, no intervalo do seu silêncio tenha sido o que disse mais. Nos discursos, o que conta não é o valor do conteúdo mas o tempo em que se agride o silêncio de não se ter terminado a horas. Na discussão, ganha quem não se cala e perde quem, às vezes sensatamente, escuta, no silêncio do seu ser, a consciência do respeito.
O silêncio não é apenas a ausência do som, como a sombra não se esgota na ausência da luz.
O silêncio existe para além da não-existência do seu oposto. (...) Não foi (...) o silêncio que veio perturbar a necessidade de ruído, mas o inverso. O silêncio é a verdade, o som a realidade da aparência. É o silêncio (...) que mede o nosso estado de espírito. Logo, não há apenas o silêncio, há silêncios.
O silêncio é consubstancial a toda a natureza e, por isso, a nós. Está presente em tudo e convive dentro de todos (...) Não é o silêncio uma forma de pureza (...) num mundo de tanta impureza? Não é o silêncio uma forma de solidão na sociedade que a ela foge em nome do seu contrário, o qual pode ser, afinal, a forma perversa de solidão na ilusão da companhia? (...)
O silêncio é uma forma de perfeição no mais intimo dos nossos espíritos.
(...)
O pôr-do-sol convida à serenidade do silêncio.
O olhar pode ser muito mais do que o silêncio de uma palavra não dita.
O silêncio da oração pode ser dito por palavras.
O silêncio de quem está só pode quebrar a solidão aparente do som que não está presente. O silêncio é a forma serena de adormecer e o modo suave de acordar.
O silêncio do reencontro é a forma perfeita do abraço.
O silêncio na morte do ente ou amigo diz tudo no respeito de nada dizer.
(...)
O silêncio incomoda porque interpela, perturba porque brota da alma, aborrece porque não rende, afasta porque se crê não comunicar, desafia porque pode ser uma forma de pedagogia.
(...)
Silêncio sempre diferente na igualdade da diferença de cada um, diferente dos outros (...)
(...)
O silêncio é, hoje, motivo de chacota e sintoma de crítica. Já lá vai o tempo em que o silêncio era de ouro. (..)
O silêncio não se explica, ouve-se. Convida-nos à profilaxia da introspecção, aproxima-nos de nós mesmos, (...). O silêncio é o eco da nossa existência e o som da nossa não-existência. (...) é a mais sublime forma de purificação e de reencontro com nós mesmos. (...) não acaba, porque não tem medida, nem tempo. Como tal, o silêncio é eterno e existe para além de nós, imensidão do universo e na compreensão de Deus. (...)", Do lado de cá, ao deus-dará, de Bagão Félix.

Silêncios: alegria, desgosto, amor, fé, concordância, discordância, liberdade, eloquência, serenidade, desespero, esperança, convicção, ignorância, verdade, fingimento, coragem, medo.

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